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Esquerda aumenta pressão sobre Macron com ameaça de destituição

22 de agosto de 2024

Dirigentes da França Insubmissa ameaçam recorrer ao mecanismo constitucional de destituição do Presidente da República caso este não siga a “tradição republicana” e se recuse a nomear Lucie Castets como primeira-ministra.

Numa tribuna publicada este domingo, oito dirigentes da França Insubmissa - entre os quais o líder histórico Jean-Luc Mélenchon, o coordenador Manuel Bompard e a líder parlamentar Mathilde Panot - deixaram um “aviso solene” a Emmanuel Macron no início de uma semana que se espera decisiva para a formação de um governo. Além de impor um adiamento da decisão, justificando-o com a realização dos Jogos Olímpicos em Paris, Macron não esconde o desejo de nomear para a chefia do governo alguém que não se reveja no programa do bloco mais votado nas eleições de junho. Para o dia 23 de agosto está prevista uma ronda de audiências do Presidente com os vários partidos parlamentares em que a Nova Frente Popular irá propor a nomeação imediata de Lucie Castets, a economista que gere as finanças da capital francesa e foi indicada pelo Partido Socialista.

“O Presidente deve aceitar o resultado da votação legislativa e nomear Lucie Castets como primeira-ministra, tal como proposto pela Nova Frente Popular. Se não o fizer, deve saber que serão utilizados todos os meios constitucionais para o destituir, em vez de nos sujeitar à sua péssima jogada contra a regra básica da democracia: em França, o único soberano é o voto popular!”, concluem os dirigentes insubmissos na sua tribuna.

Em causa está o recurso ao artigo 68º da Constituição francesa, que desde a revisão de 2007 e da lei orgânica de 2014 prevê uma forma de destituir o presidente “em caso de violação dos seus deveres que seja manifestamente incompatível com o exercício do seu mandato”. Até agora o mecanismo nunca foi invocado e as suas condições foram propositadamente delineadas para dificultar a sua aplicação. Para os insubmissos, o facto de o Presidente ignorar o resultado das eleições legislativas, afirmando que ninguém as ganhou quando na eleição anterior empossou de imediato o bloco mais votado - que o apoiava - em condições semelhantes, é motivo suficiente para estrear o mecanismo.

Se a ameaça se concretizar, o primeiro passo é fazê-la passar pelo gabinete da Assembleia, onde a Nova Frente Popular tem maioria. O segundo é conseguir o apoio de dois terços dos deputados para aprovarem a convocatória de reunião de um Alto Tribunal. O terceiro é conseguir o mesmo apoio entre os membros do Senado francês. Por fim, esse Tribunal, composto por 22 elementos escolhidos pelos gabinetes da Assembleia e Senado, teria de se pronunciar por voto secreto e também com maioria de dois terços a favor da destituição.

Além da manobra de pressão sobre o Eliseu nesta semana decisiva, a intenção da França Insubmissa é também a de provocar a clarificação política da direita dos Republicanos, que apesar do discurso de demarcação face ao bloco macronista fez os acordos de bastidores que levaram à reeleição da atual presidente do Parlamento, Yael Braun-Pivet. Mas primeiro será preciso ultrapassar a primeira etapa, a de convencer os parceiros da Nova Frente Popular.

Tal não parece tarefa fácil, a julgar pela reação imediata do líder socialista Olivier Faure, a lembrar que a iniciativa só vincula os seus autores. “A resposta à nomeação de um Primeiro-Ministro que não esteja em conformidade com a tradição republicana é a censura”, escreveu Faure no X.

Em declarações ao Mediapart, a líder dos Ecologistas, Marine Tondelier, diz que “cada um reage à sua maneira, não é preciso dramatizar. No que diz respeito aos ecologistas, estamos a dedicar toda a nossa energia a assegurar que Lucie Castets seja nomeada o mais rapidamente possível”.