POR ANGÉLINE DESDEVISES
TRADUÇÃO
PEDRO SILVA
Via Jacobina
Meses após a queda e fuga de Bashar al-Assad na Síria, a população curda do país enfrenta incertezas constantes — e ataques aéreos turcos. Uma série de fotos de Angéline Desdevises retrata as dificuldades dos curdos em se adaptar a uma realidade cada vez mais instável.
Mais de seis meses após a queda de Bashar al-Assad, o destino da população curda da Síria permanece incerto. Embora o novo presidente Ahmed al-Sharaa tenha declarado uma nova constituição provisória em março, a grande questão – não mencionada – era o lugar dos curdos no novo Estado. Soma-se a isso a situação militar cada vez mais perigosa. Ataques aéreos da vizinha Turquia se multiplicaram na região autônoma do norte e leste da Síria, levando milhares de famílias ao exílio.
No Eufrates, a Represa de Tishrin é palco de confrontos entre as Forças Democráticas Sírias (lideradas principalmente por curdos) e grupos armados pró-turcos, custando a vida de muitos civis. Ao mesmo tempo, a ameaça jihadista cresce, e cerca de 39.000 famílias acusadas de serem filiadas ao ISIS se refugiaram no campo de al-Hol, no norte do país. De Qamishli a Kobane, passando por Hasakah e Raqqa, o destino do povo de Rojava está mais ameaçado do que nunca.
Nos últimos dois anos, a fotógrafa e escritora Angéline Desdevises viajou pela Turquia e pela Síria. Nesta série de fotos, tendo como pano de fundo a recente queda de Assad, ela retrata a vida no nordeste da Síria após anos de conflito.

Kobane, 27 de janeiro de 2025. Uma criança chora em meio aos escombros de um bairro da cidade destruído durante a guerra contra o Da’esh (ISIS) em 2015.

Um prédio que pertenceu ao regime Baath agora está ocupado pelos Asayishs (o equivalente à polícia). Cartazes de Hafez e Bashar al-Assad foram retirados.

O posto na fronteira de Semalka, entre o Curdistão iraquiano e a Administração Autônoma do Norte e Leste da Síria. Desde a queda do regime, famílias sírias que se refugiaram no Iraque por causa da guerra civil têm retornado para casa.

Em Qamishli, onde a inflação é altíssima, as pessoas não conseguem sustentar suas famílias. Pão subsidiado é distribuído diariamente em todos os distritos.

Em Kobane, uma mãe e seus filhos caminham ao longo da fronteira turca. Famílias ainda vivem nesta parte da cidade, em ruínas desde a guerra contra o Daesh.

Após a queda do regime, esta casa, lar de uma família cristã, foi abandonada. Refugiados curdos de Afrin (território ocupado pela Turquia desde 2018) foram acolhidos ali.

Um drone turco bombardeou o centro de Kobane em 29 de janeiro. Duas pessoas morreram no ataque.

Uma criança é levada às pressas para um hospital em Kobane após ficar gravemente ferida em ataques aéreos turcos em 28 de janeiro na vila de Sarrine, a algumas dezenas de quilômetros da frente de Ticherine (Aleppo).

O posto de controle que leva ao aeroporto de Qamishli agora é controlado pelos Asayish.

Em Hasakah, um pequeno grupo de mulheres voluntárias se organiza diariamente para defender seu bairro. Elas são as HPC-Jin, as forças de defesa civil.

A oliveira, uma árvore simbólica para os curdos da região, na vila de Hêjî, perto de Kobane.

Retrato de uma aldeã Hêjî. Ela coordena a preparação das refeições a serem entregues na frente de Tishrin para alimentar os soldados.

Em Raqqa, uma família curda vive neste único quarto pequeno e escuro.

Após fugirem para Sherba em 2018, famílias de Afrin foram forçadas a pegar a estrada novamente devido à nova ofensiva do Exército Nacional Sírio, apoiado pela Turquia. Em Raqqa, uma escola no centro da cidade os acolhe.

Mais de 39.000 pessoas acusadas de terem ligações com o ISIS são refugiadas no campo de al-Hol, no nordeste da Síria.

Qamichli, um antigo distrito do regime com lojas fechadas, está mergulhado na escuridão.

Enterro de dois políticos curdos mortos por um drone turco em 27 de janeiro no Curdistão iraquiano.

A família enterra os caixões ela mesma

Duas meninas voltando da escola caminham ao longo de um mural que simboliza a história do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK). Nesta parte está inscrito o slogan “Jin, Jiyan, Azadi” (Mulher, Vida, Liberdade).
Angéline Desdevises
é escritora e fotógrafa, membro da plataforma Hans Lucas. Ela cobre questões políticas e sociais em zonas de conflito.