Extrema-direita lança caos no Reino Unido com manifestações xenófobas e violentas

Depois de uma semana de protestos, violência racista instigada por desinformação explode no Reino Unido. Centros de abrigo a requerentes de asilo atacados pela extrema-direita. Governo dá conta de centenas de detidos.

No fim-de-semana passado, a calma que o Reino Unido costuma viver em período de férias foi interrompida por protestos xenófobos e violentos de extrema-direita que causaram caos e destruição em várias cidades por toda a Grã-Bretanha. Os manifestantes causaram incêndios, saquearam lojas, vandalizaram e invadiram hotéis que serviam de abrigo para migrantes e envolveram-se em confrontos violentos com a polícia e com contra-manifestantes.

Na origem dos protestos estão as notícias e falsas que têm circulado sobre o esfaqueamento em Southport, que vitimou três crianças, incluindo uma portuguesa. A torrente de informação falsa acusava um requerente de asilo muçulmano, que rotulam de terrorista, de ser o atacante. Os conteúdos que antagonizam e culpabilizam os imigrantes e refugiados pelo ataque foram partilhados nas redes sociais e tiveram origem numa plataforma com o nome “Channel 3 Now”, que o Guardian identificou como um portal que “mistura conteúdos do Reino Unido e dos Estados Unidos da América, potencialmente gerados com Inteligência Artificial”, e que partilhou um nome falso para o culpado pelos esfaqueamentos.

Para a desinformação contribuíram também figuras ligadas à extrema-direita britânica, como Tommy Robinson, um famoso “influencer” anti-imigração ou Nigel Farage, líder do partido Reform UK, que acusou a polícia de reter informação sobre o caso do esfaqueamento, deixando implícita a ideia de que o culpado seria o requerente de asilo inventado.

As notícias falsas causaram confusão na população do Reino Unido e, como resposta, os tribunais sentiram-se obrigados a divulgar a identidade do principal suspeito pelo ato de violência. Ao contrário do que dizia a informação falsa, o acusado não é um imigrante muçulmano mas Axel Rudakubana, nascido em Cardiff, na Inglaterra.

Não obstante, milhares de manifestantes de extrema-direita saíram à rua por todo o país com motivações xenófobas, protestando a presença de imigrantes no Reino Unido, causando distúrbios em Liverpool, Manchester, Bristol, Belfast, Stoke-on-Trent, Hull e outras cidades na Grã-Bretanha e na Irlanda do Norte.

O grupo de extrema-direita English Defence League foi identificado pela polícia britânica como responsável pelos protestos violentos em Southport, mas surgem evidências de que vários militantes neonazis e de extrema-direita convocaram as manifestações em diferentes cidades.

Violência xenófoba choca o país

Ao longo do fim-de-semana, a violência racista foi aumentando nas manifestações. Em Rotherham, um hotel que abrigava refugiados foi invadido pelos manifestantes de extrema-direita, que partiram janelas e tentaram incendiar o edifício enquanto gritavam “Get them out!” (Tirem-nos cá para fora!), entrando depois em confrontos com a polícia.

Algumas horas mais tarde, em Tamsworth, outro grupo atacou novamente um hotel que abrigava requerentes de asilo, conseguindo mesmo começar um incêndio. Em Hull os manifestantes de extrema-direita partiram as janelas de outro hotel. Por todo o país foram atiradas pedras, garrafas de cerveja e cadeiras em confrontos com a polícia. Durante o fim-de-semana foram detidas mais de 140 pessoas.

A onda de violência vinha crescendo desde o ataque em Southport, e já na sexta-feira passada a manifestação xenófoba em Sunderland tinha culminado com a vandalização do centro da cidade e com o incêndio de edifícios e veículos. Oito pessoas foram detidas por roubo e três polícias ficaram feridos.

O Governo de Keir Starmer já respondeu à violência. A Ministra do Interior, Yvette Cooper, prometeu que os manifestantes que causaram o caos iriam enfrentar a Justiça. “Temos visto violência criminosa verdadeiramente assustadora em algumas das nossas cidades e vilas. É uma vergonha total”, disse em entrevista à Radio 4.

Segundo Cooper, a polícia irá perseguir os culpados com penas severas como “sentenças de prisões, identificações a longo termo e proibições de viagem”. A Ministra garantiu ainda que centenas de pessoas já foram detidas e que o Governo está a garantir recursos adicionais à Justiça para permitir uma “justiça célere”. Já o primeiro-ministro, garantiu que tem um “exército” de polícias em espera para lidar com os manifestantes de extrema-direita, garantindo que também haverão consequências contra atividades ilegais online.

Esta segunda-feira, Jeremy Corbyn e mais quatro deputados independentes entregaram uma carta à Ministra do Interior onde criticam o Governo por não agir usando todos os meios disponíveis. “Quando as pessoas são atacadas pela cor da sua pele e pela sua fé, a referência do Governo a ‘medos compreensíveis’ envia sinais confusos e apenas ajuda aqueles que procuram semear o ódio e a divisão”, escreveram, referindo-se às tomadas de posições do Governo trabalhista.

Os independentes criticam ainda o facto de o Governo não contemplar reunir-se com o Conselho Muçulmano Britânico e outras associações muçulmanas para procurar respostas contra o que apelidam de “terror racista”.