Fernanda Fonseca
José Luis Costa
Publicado em Poder360
Há 30 anos, a África do Sul realizava as primeiras eleições gerais abertas a todos os cidadãos, independentemente de raça ou classe social. O pleito de 27 de abril de 1994 marcou o início do sufrágio universal no país e representou o fim do regime de apartheid, uma política de segregação racial em vigor desde 1948. Neste sábado (27.abr), os sul-africanos comemoram o “Dia da Liberdade”, que relembra a eleição de Nelson Mandela, líder do partido ANC (Congresso Nacional Africano), como presidente pela Assembleia Nacional em 1994. Mandela se tornou o 1º chefe de Estado negro da África do Sul, em vigor desde 1948.
Neste sábado (27.abr), os sul-africanos comemoram o “Dia da Liberdade”, que relembra a eleição de Nelson Mandela, líder do partido ANC (Congresso Nacional Africano), como presidente pela Assembleia Nacional em 1994. Mandela se tornou o 1º chefe de Estado negro da África do Sul, em um pleito que permitiu pela 1ª vez que a população negra exercesse seu direito ao voto.
As primeiras eleições democráticas da África do Sul foram o resultado de 4 anos de negociações, que tiveram início em 1990 com a legalização dos “movimentos de libertação”. Além do ANC, o SACP (Partido Comunista Sul-Africano) e o PAC (Congresso Pan-Africanista) também foram legalizados.
Paulo Neves, professor de Sociologia e Políticas Públicas na UFABC (Universidade Federal do ABC) explica que a realização do pleito também foi impulsionada pelo repúdio generalizado à política do apartheid, especialmente por parte de líderes internacionais, como os Estados Unidos. De acordo com Neves, a pressão da opinião pública obrigou as empresas a se absterem de fazer negócios com a África do Sul, levando alguns países a aderirem ao boicote.
“Por um lado, havia uma pressão internacional que tornava difícil para as empresas sul-africanas conduzirem seus negócios no mercado global. Por exemplo, muitos consumidores em diversos países boicotavam empresas que mantinham filiais na África do Sul”, observa o especialista em entrevista ao Poder360.
Os anos anteriores a eleição de 1994 também foram marcados por um aumento da violência política, com agentes de segurança estatais e paramilitares entrando em confronto com integrantes do ANC e civis simpáticos ao movimento.
Segundo Neves, diante da instabilidade, o partido de Mandela percebeu a dificuldade de uma vitória militar, ao mesmo tempo que o governo reconhecia a pressão crescente pelo fim do apartheid. “O governo sul-africano já percebia claramente que eles perderam a luta do ponto de vista moral simbólico”, diz.
O ANC obteve 62,65% dos votos na eleição de 1994, enquanto o Partido Nacional, liderado pelo então presidente Frederik Willem de Klerk, conseguiu 20,39%. Depois do pleito, o desafio passou a ser como realizar uma transição política pacífica.
“Nesse contexto, Mandela desempenhou o papel crucial de ter a autoridade moral para garantir que a transição ocorresse de maneira relativamente pacífica, minimizando o derramamento de sangue e assegurando a prevalência da democracia”, acrescenta Neves.
PROMESSAS NÃO CUMPRIDAS
Durante a campanha eleitoral, o partido de Mandela se comprometeu, conforme seu manifesto, a construir uma África do Sul “não racial, não sexista e democrática”. A sigla enfatizou a importância de garantir os direitos dos trabalhadores, erradicar a pobreza rural e priorizar setores como educação, habitação e saúde.
Trinta anos depois, as promessas da ANC ainda não foram cumpridas. O partido segue no poder desde o fim do apartheid. De acordo com uma análise conduzida pelo Banco Mundial em 2022, constatou-se que o avanço político na África do Sul não foi paralelo ao avanço em termos de equidade econômica. Desde o término do apartheid, a disparidade econômica e salarial ainda é um problema; os 10% mais ricos detêm 71% da riqueza nacional, enquanto os 60% mais pobres possuem apenas 7%.
O país também possui 32,8% da população adulta desempregada e convive com apagões que fazem a economia deixar de movimentar até US$ 50 milhões por dia, conforme estudo da consultoria norte-americana Stratfor. Nesse cenário, o FMI (Fundo Monetário Internacional) projeta que a economia sul-africana não cresça mais que 2% até 2028. Explicando o porquê da economia sul-africana estar estagnada, o professor Neves afirma que o Congresso Nacional Africano não foi capaz de estabelecer políticas públicas efetivas para combater os problemas econômicos e sociais, que aumentaram desde o fim do regime de segregação racial.
A África do Sul voltará a realizar eleições presidenciais em 29 de maio. De acordo com pesquisa de intenção de votos, os problemas sociais do país junto às crises econômica farão o ANC perder cadeiras para o Parlamento do país e, pela 1ª vez, precisará formar coalizão para eleger o novo presidente do país.
“O ANC é muito criticado pela corrupção. Muitos jovens sobretudo vão falar da corrupção como um dos principais legados do ANC. Por ter o controle do Estado, o partido possibilitava que integrantes tivessem uma ascensão econômica diferenciada, sendo criticado por não ter promovido a redução que integrantes tivessem uma ascensão econômica diferenciada, sendo criticado por não ter promovido a redução da desigualdade no país”, afirmou Neves. O especialista complementa afirmando que o Brasil e a África do Sul possuem dilemas semelhantes politicamente.
Para ele, a democracia de ambos os países não foi suficiente para superar as esperanças criadas pelas populações. “A democracia na África do Sul, assim como no Brasil, não respondeu plenamente às esperanças que a população tinha em termos econômicos, então isso gera uma certa crise”, declarou ao Poder360.