Massacres de civis revelam natureza do novo regime da Síria

Israel dá passo para anexar sul do país

Via Revista Forum

As imagens feitas com celulares circularam nas redes sociais, causando espanto. Algumas mostram um homem executando civis com tiros na cabeça. Outras registram grupos de pessoas mortas na região costeira da Síria, onde vivem os alauitas que eram fieis ao governo de Bashar al-Assad.

Os alauitas são uma corrente do islã xiita.

Assad foi derrubado em dezembro pelo grupo militante sunita Hay'at Tahrir al-Sham (HTS) -- com apoio da Turquia, Estados Unidos e Israel.

Um recente perfil publicado pelo diário britânico Financial Times revela que Abu Mohammad al-Jolani, nome de guerra do novo presidente da Síria, Ahmed al-Sharaa, nasceu na Arábia Saudita. A família dele é originária das colinas de Golã, hoje ocupadas por Israel.

Jolani, que lutou no Iraque contra a ocupação estadunidense ao lado de partidários de Saddam Hussein, já ficou preso em Abu Ghraib e comandou um sub-grupo da Al-Qaeda, o Nusra, oficialmente definido como "terrorista" pelos Estados Unidos.

Desde que ele derrubou Assad, no entanto -- resultando na retirada de tropas russas estacionadas na Síria, inclusive do importante porto de Tartus, no Mediterrâneo -- Jolani foi "repaginado" pela mídia ocidental como líder "democrata".

Governo em família

Os massacres dos últimos dias, no entanto, revelam a verdadeira natureza do bando que assumiu o poder: mesmo com cobertura favorável da mídia ocidental, que tenta mitigar a responsabilidade de Jolani, é impossível esconder as imagens de carnificina e os depoimentos feitos por alauitas nas redes sociais.

Em resposta a suposto confronto entre partidários de Assad e forças fiéis a Jolani, ao menos 740 civis foram assassinados, de acordo com o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, baseado em Londres.

Oficialmente, o governo disse ter retirado suas tropas das províncias costeiras de Latakia e Tartus, mas o Observatório publicou nota nesta segunda-feira, 10, segundo a qual forças leais ao governo tocaram fogo e saquearam casas em Banyia, na costa.

Ouvido pela BBC, um morador da cidade, Ayman Fares, disse que os autores dos ataques eram provavelmente chechenos ou usbeques.

O grupo que Jolani comanda mobilizou mercenários e "soldados da fé" de várias origens no mundo sunita.

Antes de dedicar longos parágrafos a justificar os crimes cometidos pelo governo sírio nos últimos dias, a BBC registrou o depoimento de outro homem de Banyia, que se identificou apenas como Ali. Ele disse que historicamente os alauitas conviveram com sunitas e cristãos na região costeira.

Eles estavam atrás de dinheiro. Eles bateram na porta do nosso vizinho, levando seu carro, seu dinheiro e todo o ouro ou objetos de valor que ele tinha em casa.

Assassinatos de vingança

Desde que o governo Assad foi derrubado, o Observatório dos Direitos Humanos diz ter registrado 475 assassinatos "de vingança" na Síria.

O esclarecedor perfil de Jolani publicado pelo Financial Times diz que o novo presidente governa com familiares e com homens originalmente ligados à al-Qaeda, como o chefe da inteligência, Anas Khattab.

Os gestos que ele faz publicamente são jogadas de marketing, como a aparição da mulher Latifa em uma visita à Arábia Saudita.

Com o governo dependente de apoio externo, a balcanização da Síria parece inevitável, com "esferas de influência" divididas entre a Turquia, os Estados Unidos e Israel.

Israel, aliás, anunciou que vai permitir que os drusos que vivem no Sul da Síria entrem para trabalhar nas colinas de Golã, território sírio que Tel Aviv anexou.

Isso deve garantir a expansão de fato do território de Israel, com a incorporação de vilarejos sírios antes controlados pelo governo de Assad.