RODRIGO PAZ ELEITO PRESIDENTE DA BOLÍVIA,

O RETORNO DA DIREITA AO PODER

Por Chantal Liégeois

Imagem: Reprodução Brasil de Fato

Neste domingo, 19 de outubro, ocorreu o segundo turno das eleições presidenciais na Bolívia. O candidato do Partido Democrata Cristão (PDC), é o vencedor do segundo turno das eleições e assumirá a presidência no próximo dia 8 de novembro, para o período 2025-2030.

O Tribunal Supremo Eleitoral (TSE), de acordo com o Sistema de Resultados Preliminares (Sirepre) anunciou que Rodrigo Paz alcançou 3.348.747 votos, com 54,57%, - já havia conquistado a maioria dos votos no primeiro turno-, enquanto o candidato de Aliança Libre, Jorge Tuto Quiroga, obteve 2.788.326 votos, com 45,43%, perdendo sua quarta disputa pela presidência do Estado Plurinacional da Bolívia. Registrou-se uma participação de 85% dos 7,5 milhões de bolivianos habilitados. Apenas um 5,5% de votos nulos e brancos. Esta foi a primeira vez que se utilizou o mecanismo de segundo turno, estabelecido na Constituição de 2009 do Estado Plurinacional da Bolívia.

Rodrigo Paz (58 anos) é filho do ex-presidente Jaime Paz Zamora (1989-1993). Ao longo da sua carreira, foi deputado, vereador, presidente da Câmara Municipal de Tarija e atual senador. A partir de 8 de novembro, assumirá o cargo de presidente do Estado.

A direita política retorna ao poder após duas décadas do processo de mudança liderado pelo Movimento ao Socialismo (MAS), com as presidências de Evo Morales (2006-2019) e Luis Arce Catacora (2020-2025). Vale notar que o MAS oficialista – eliminado drasticamente no primeiro turno- e o setor de Evo Morales -que havia pedido a votar nulo no primeiro turno- , não deram orientação de voto para o segundo turno, porém as maiorias escolheram o “mal menor”.

No plano econômico, a Bolívia enfrenta a sua pior crise em décadas, caracterizada pela escassez de divisas (esgotamento das reservas internacionais em dólares), a falta de combustível, o que paralisa a atividade econômica provocando recessão, o aumento dos preços e da inflação (20%), um panorama muito difícil para a maioria dos bolivianos. Esta situação gerou nos últimos meses uma grande instabilidade política e social.

A economia boliviana atravessa um ciclo de deterioração desde 2014, quando o Produto Interno Bruto (PIB) crescia a 6,8%. Hoje, o país enfrenta a sua primeira recessão em quase 40 anos: o PIB caiu -2,4% no primeiro semestre de 2025, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE). Os bloqueios políticos en março, maio e junho de 2025 afetaram o transporte e a cadeia produtiva, com as atividades extrativas caindo 12,98%.

Outro flagelo: os incêndios. Em 2024, a Bolívia se tornou o segundo país do mundo com mais perdas de florestas primárias, com um recorde de 1,4 milhão de hectares desaparecidos, de acordo com o observatório Global Forest Watch. Os incêndios são consequência da expansão da agricultura e da pecuária no país.

No plano político, esse resultado encerra o ciclo do MAS e da esquerda no poder. No novo parlamento boliviano eleito em 19 de agosto passado, no primeiro turno das eleições, o PDC, partido do presidente eleito, se impõe como a principal força política tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados, com um total de 70 representantes. O partido de Tuto Quiroga Libre é a segunda força, com 53 representantes. A terceira representação parlamentar é a da Unidad, liderada pelo empresário Doria Medina, com 35 parlamentares. A aliança Suma-te (de Manfred Reyes Villa) conta com 6 representantes. A derrota da esquerda é confirmada, com o quase desaparecimento de sua representação parlamentar: o MAS com apenas 2 eleitos e a Alianza Popular de Andrônico Rodriguez (opositor de Evo) com 8 representantes.

A única possibilidade de formar uma maioria que permita o funcionamento do parlamento e a aprovação das leis e reformas previstas é uma aliança entre as duas principais forças, o PDC do presidente e o Libre de Tuto Quiroga, aliança que já anunciaram nos seus discursos no final da campanha e que permitirá à direita impor os seus novos planos de austeridade, privatização dos recursos naturais e submissão aos planos do FMI.

Os setores do agronegócio e da mineração podem comemorar os resultados porque é precisamente a continuidade do modelo extrativista que se impõe como a única saída para a crise. Desde a época colonial, a história do país andino está intimamente ligada à exploração de seus recursos. Do ouro ao estanho, passando pelo cobre, prata e borracha, a economia do país sempre se assentou na exploração de suas matérias-primas.

O modelo econômico do Movimento ao Socialismo (MAS), de nacionalizar os recursos naturais do país para redistribuição da renda petroleira e dos recursos naturais à população, especialmente aos mais vulneráveis, permitiu reduzir a pobreza em quase 20 pontos entre 2006 e 2014. Mas essa lógica não pretendia romper com o capitalismo, mas sim gerenciá-lo “melhor” por meio da redistribuição, que favoreceria a atividade econômica interna e, assim, permitiria elevar o nível de vida. Após a queda nas vendas de gás, a dependência dessas receitas mergulhou o país em uma crise econômica.

Durante sua campanha eleitoral, Rodrigo Paz prometeu “Capitalismo para todos” por meio da promoção do crescimento do setor privado, da redução das tarifas alfandegárias para 10%, de créditos a taxas reduzidas e de um “perdão fiscal” para as empresas endividadas, mantendo os programas sociais destinados aos pobres. Toda a classe trabalhadora aspira sair da grave crise econômica, poder comer, se deslocar e encontrar trabalho mais facilmente, sem perder os direitos sociais conquistados nos governos anteriores. Os planos neoliberais para sair da crise, que fazem parte dos programas dos partidos vencedores das eleições, anunciam outra coisa. Os movimentos sociais bolivianos terão que se reorganizar rapidamente para enfrentar os planos que o grande capital, com a ajuda do FMI, e as ameaças de Trump à América Latina pretendem impor à Bolívia a partir do final do ano.


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