Por Michelle de Melo, para o Brasil de Fato
Foto: Reprodução Outras Palavras
Na França, a Assembleia Nacional continua a debater, nesta terça-feira (7), a reforma da Previdência proposta pelo presidente Emmanuel Macron, apesar do movimento de greve geral no país. O novo texto busca aumentar em dois anos a idade mínima para solicitar a aposentadoria, assim como o tempo de contribuição e rever regimes especiais de pensão. Sindicatos e movimentos populares iniciam o terceiro dia consecutivo de manifestações.
De acordo com a Central Geral de Trabalhadores, há cerca de 400 mil pessoas mobilizadas no centro de Paris em rechaço ao projeto. Em Nantes, ao noroeste do país, foram confirmadas 20 mil pessoas, e em Rennes cerca de 14,5 mil pessoas. Já ao sul, em Bourdeaux, há cerca de 10 mil manifestantes. O ministério do Interior confirmou a existência de atos em 200 cidades francesas com a presença de mais de 1 milhão de pessoas.
Dois em cada três franceses se opõem ao aumento da idade mínima de aposentadoria de 62 para 64 anos, de acordo com o Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop).
O debate começou na noite de segunda (6) no plenário da Câmara, e a votação deve acontecer no próximo sábado (11). Macron espera que o projeto seja aprovado no Senado até 26 de março e entre em vigor a partir de setembro deste ano, aplicando o aumento da idade mínima de maneira gradual, de três em três meses até 2027. Se o novo texto for aprovado, os franceses poderão demandar aposentadoria, com descontos, a partir dos 64 e só terão direito ao valor integral da pensão após os 67 anos. Somente os militares ficaram de foram da reforma.
Para a dirigente do partido França Insubmissa, Florence Poznanski, a reforma irá acarretar o aumento da massa de trabalhadores desempregados e precarizados na França.
"Hoje as pessoas mais idosas já têm muita dificuldade de encontrar e permanecer nos empregos porque são as primeiras a ser demitidas. Então vamos ter pessoas que chegarão ao final da vida economicamente ativa com dificuldade de ter renda, de ter emprego, e ainda terão aposentadorias precarizadas", analisa em entrevista ao Brasil de Fato.
A justificativa governamental é de que há um rombo nas contas do sistema previdenciário e por isso seria necessário aumentar os anos de contribuição ou a idade mínima para solicitar aposentadoria. "Mas já foi provado que isso é uma mentira. Não há um risco iminente de falência do sistema previdenciário", defende Florence Poznanski.
O déficit atual nas contas seria temporário devido ao desequilíbrio entre pessoas que estão aposentadas e pessoas que estão contribuindo com a previdência.
As centrais sindicais já organizaram duas jornadas de paralisação nacional em rechaço à reforma e lançaram uma nova convocatória para o sábado, mas os atos permanecem em várias regiões do país. "O objetivo é manter pressão", disse aos meios locais franceses o deputado da França Insubmissa, Manuel Bompard.
Os serviços de trem e voos nacionais foram afetados, assim como a visitação de pontos turísticos do país, como a Torre Eiffel e o Museu o Louvre.
O partido governista, República em Marcha, perdeu a maioria absoluta no parlamento nas eleições legislativas de abril do ano passado, com o aumento da representação de esquerda. Por isso, Macron precisa do apoio da bancada de extrema direita para aprovar a reforma.
"A extrema direita já sinalizou apoios, mas pode mudar rapidamente. Então o contexto não está tão claro e a mobilização é grande", avalia Florence Poznanski .
A coalizão de esquerda Nova União Popular Ecológica e Social (Nupes), composta por 131 deputados, propôs que as mudanças fossem aprovadas em referendo, mas a proposta foi barrada por 292 votos contra 243 a favor na sessão da última segunda (6).
Se o texto da reforma não for aprovado pela maioria dos parlamentares, a primeira-ministra Elisabeth Borne disse que pode recorrer ao artigo 49.3 da Constituição, que autoriza a premiê a levar adiante o projeto no Legislativo se receber o aval do Conselho de Ministros. Nesta legislatura, Borne já recorreu dez vezes ao artigo 49.3 para levar adiante políticas sem maioria parlamentar.
Neste caso, além de manter a mobilização, Florence Poznanski afirma que o último recurso para barrar a reforma seria entrar com uma ação no Conselho Constitucional, que poderia declarar a inconsistência jurídica da proposta. "Mas o povo está disposto a lutar e isso é uma grande notícia", conclui.