Israel descumpriu ao menos 6 resoluções da ONU em 20 anos

Com informações de Poder 360

Países são obrigados a seguir determinações do Conselho de Segurança, mas falta de um poder supranacional permite descumprimento.

Israel descumpriu ao menos 6 resoluções do Conselho de Segurança da ONU sobre a Palestina desde 2004. Dentre eles, 3 foram aprovadas no órgão das Nações Unidas depois do início da investida na Faixa de Gaza em 7 de outubro de 2023. O conflito completou 6 meses nesse domingo (7.abr.2024). A resolução mais recente foi aprovada em 25 de março por 14 votos a favor, nenhum contrário e uma abstenção dos Estados Unidos. O documento foi apresentado pelos atuais 10 integrantes não permanentes do conselho (Argélia, Equador, Guiana, Japão, Malta, Moçambique, Coreia do Sul, Serra Leoa, Eslovênia e Suíça).

O texto exigiu, entre outras medidas, um cessar-fogo “imediato” do bombardeio israelense durante o Ramadã, período sagrado para os muçulmanos que, neste ano, começou em 10 de março e terminou na 3ª feira (9.abr). Depois da aprovação, o governo de Israel disse que não cumpriria a decisão, seguindo a mesma atitude adotada em outras duas resoluções aprovadas pelo Conselho de Segurança depois dos ataques de 7 de outubro de 2023. Uma delas, ratificada em 15 de novembro de 2023, exigiu pausas nos ataques e a criação de “corredores humanitários urgentes e prolongados em toda a Faixa de Gaza por um número suficiente de dias” para permitir o acesso humanitário. A outra, aprovada em 22 de dezembro de 2023, determinou a proteção de civis e viabilização de assistência humanitária imediata aos palestinos em Gaza.

A professora de relações internacionais e coordenadora do Geppic (Grupo de Pesquisa em Estudos Estratégicos e Política Internacional Contemporânea) da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Danielle Jacon Ayres Pinto, avalia que Israel é uma “tradicional descumpridora das resoluções do conselho”.

Nos últimos 20 anos, antes da investida atual na Faixa de Gaza, o país também ignorou outras 3 resoluções sobre a Palestina. A 1ª, de 19 de maio de 2004, exigiu que Israel não demolisse casas em um campo de refugiados em Rafah, cidade no sul de Gaza. Também manifestou grande preocupação com a situação humanitária na região.

Na época, se deu a 2ª Intifada (2000-2005), um conjunto de eventos nos quais palestinos se revoltaram contra a ocupação israelenses em seus territórios. O governo de Israel afirmou que a demolição de casas era necessária para impedir contrabandistas de armas e para proteger soldados israelenses na região de ataques de combatentes palestinos.

A 2ª resolução foi aprovada pelo Conselho de Segurança em 8 de janeiro de 2009. O documento se refere ao conflito na Faixa de Gaza iniciado em dezembro 2008, depois que o braço armado do Hamas lançou ataques contra Israel. O texto exigiu um cessar-fogo imediato, duradouro e totalmente respeitável que levasse à retirada total das forças israelenses de Gaza.

O governo de Israel, porém, anunciou a interrupção dos ataques 9 dias depois, em 17 de janeiro de 2009. O conflito só chegou ao fim em 18 de janeiro de 2009, quando o Hamas também concordou com o cessar-fogo.

Já a 3ª resolução, aprovada em 23 de dezembro de 2016, referiu-se a construção de comunidades judaicas em territórios palestinos. A determinação condenou e decretou a prática como ilegal. Os chamados assentamentos israelenses existem até os dias atuais.

Israel, no entanto, não foi o único país a ignorar as determinações do Conselho de Segurança da ONU ao decorrer da história. Danielle Jacon explica que isso se dá principalmente porque não existe um “poder supranacional” no sistema internacional, ou seja, um poder que está acima dos Estados integrantes das Nações Unidas.

“Os Estados não abrem mão de suas soberanias ou não passam para ONU nenhum poder que faça com que as próprias Nações Unidas os obrigue a fazer aquilo que eles não querem. Então, o que acontece é que eles podem, mesmo sendo parte da organização, cumprir ou não aquilo que a ONU determina”, disse em entrevista ao Poder360.

Por causa disso, a efetividade das resoluções do Conselho de Segurança difere entre a teoria e a prática. No âmbito teórico, o artigo 25 da Carta da ONU, assinada por todos os países da organização, estabelece que os Estados integrantes “concordam em aceitar e executar as decisões” do órgão. Isso cria uma legitimidade e um efeito vinculante para as resoluções.

“[Elas] têm um caráter que obriga os integrantes [das Nações Unidas] a cumpri-las. É diferente das resoluções tomadas na Assembleia Geral. Nela, os documentos têm um caráter de recomendação”, disse a especialista.

Também na teoria, medidas punitivas podem ser tomadas pelo conselho contra países que descumprirem determinações. Dentre as penalidades estão sanções econômicas, fim da representatividade em fóruns da ONU e uma missão de paz. Segundo Danielle Jacon, o envio de forças de paz deve ser votado. Já os bloqueios econômicos podem ser analisados no conselho, mas também podem ser aplicados unilateralmente. “Quem aplica sanções não é as Nações Unidas. A organização não tem essa força. Quem impõe as sanções são os países membros”, ponderou.

A especialista também avalia que o descumprimento de resoluções resultou em “pouquíssimas ações” do tipo. Afirmou ainda que a efetividade de uma resolução do Conselho de Segurança “sempre fica a cargo do jogo político que está por trás dos atores envolvidos”.

Integram o órgão da ONU 15 países. Dentre eles, 5 são permanentes (China, França, Rússia, Reino Unido e Estados Unidos) e têm poder de veto. Os outros 10 são os chamados membros rotativos eleitos pela Assembleia Geral para mandatos de 2 anos.