O reino da indignidade e da insensatez

Tradução: Equipe Radar Internacional

Mensagem à comunidade dos Estados:


Além da destruição sistemática da Faixa de Gaza e da hecatombe da sua população, a fome e a destruição de instalações médicas se somam à guerra genocida. O Estado de Israel decidiu que nenhum palestino deve permanecer na sua terra.


Observamos, devastados e invadidos por uma vergonha universal incomensurável, a primeira fase da limpeza étnica do enclave, que está se ampliando com a anunciada para a Cisjordânia.


Voces vao permitir que o governo dos Estados Unidos converta Gaza em uma “Riviera”?


O povo palestino está sendo submetido a um genocidio, uma guerra de exterminio no sentido em que Raphael Lemkin a definiu: “um ato de genocidio dirigido contra um grupo nacional como entidade, e os atos em questão estao dirigidos contra individuos, não como individuos, mas sim como membros de seu grupo nacional”.


Se a Carta das Nações Unidas reconhece o direito de um Estado atacado a se defender (Art. 51), este direito se aplica a uma potência que exerce uma ocupação ilegal? É uma questão que pode ser debatida. Em qualquer caso, nenhum Estado tem direito a usar uma força desproporcional, como está fazendo atualmente o Estado colonizador. O princípio da proporcionalidade implica que uma ação não deve ser mais devastadora que o dano já sofrido. Todavia, na sua resposta, o Estado de Israel optou por uma violência cega que viola o princípio de proporcionalidade, ao não respeitar nenhum equilíbrio entre o objetivo - salvar os reféns - e os meios empregados. O verdadeiro objetivo: exterminar o maior número possível de palestinos.


Se a noção de princípio estabelece requisitos para a otimização de valores e interesses, enquanto as normas e regras são apresentadas com frequência como de natureza ontológica, lógica ou metodológica, o princípio de proporcionalidade não deveria prevalecer sobre outras formas e regras? Não é ainda mais evidente quando um primeiro-ministro afirma que o Hamas deve ser erradicado e, consequentemente, recebe o respaldo de uma grande parte da comunidade internacional, em particular dos seus aliados ocidentais, que, assim como ele, se opõem à barbárie? Nessas condições, é fácil determinar o limite da proporcionalidade.


Quem é mais bárbaro? Aquele que luta contra uma ocupação colonial ilegal e por seu direito inalienável a autodeterminação, embora cometa atos criminosos no processo, ou o que, por vergonha e sobretudo para alcançar objetivos expansionistas da extrema-direita, busca eliminar todo um povo de sua terra?


Quem ajuda um Estado a cometer genocídio ou crimes de guerra em grande escala e de forma planejada e sistemática? Quem fecha os olhos, fingindo ou não saber, enquanto os corpos se acumulam sob os escombros, ou não vê na profundidade dos olhos das crianças a desumanização de um mundo que diz ser defensor da democracia e dos direitos humanos?

Por que, frente a este desastre para a humanidade, alguns países, sem coincidência alguma, ajudam o Estado de Israel proporcionando-lhe ajuda militar ou financeira?


Vocês não podem ignorar o fato de que, ao ajudar ou prestar assistência a este país reconhecendo seu direito a se defender como potência ocupante, esses países comprometem a responsabilidade internacional do seu Estado e se convertem em cumplices da ocupação ilegal, da colonização, do apartheid e da limpeza etnica na Cisjordania e na Faixa de Gaza, e inclusive em relação aos beduinos no territorio sob jurisdiçao israelense. Sem mencionar os crimes de guerra cometidos durante mais de 78 anos, que, apesar de numerosas resoluções do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral, violam todos os direitos humanos e os direitos das populações civis em tempos de guerra garantidos pelo IV Convênio de Genebra.


Em agosto, no 75 aniversário da adoção deste convênio, vocês afirmarão que ele representa um grande avanço na proteção das populações civis, quando o exército de ocupação israelense está destruindo sistematicamente escolas, hospitais, abrigos e centros da UNRWA, e quando a reunião dos Altos Estados Contratantes dos convênios de Genebra, programada para 7 de março, foi cancelada de última hora devido a lamentável postura do governo suíço e da Europa?


É necessário recordar que um terceiro Estado não necessita participar diretamente de um ato internacionalmente ilícito - como os Estados Unidos, corresponsável da guerra genocida levada a cabo por seu aliado israelense - para compartilhar a responsabilidade do mesmo? Basta proporcionar assistência voluntária para a realização de um ato ilícito ou para a sua prolongação no tempo, e isso se aplica a todos os Estados que, entre outras coisas, facilitam e apoiam que suas empresas assinem contratos para vender componentes ou armas ao Estado israelense.


É evidente que uma das consequências diretas de um ato internacionalmente ilícito é que todos os sujeitos do direito internacional estão obrigados a reparar. A reparação, que consiste na obrigação de apagar as consequências do ato ilícito internacional, aparece antes de tudo como um mecanismo de sanção pela violação do direito internacional.


Por que correm para ajudar a Ucrânia invadida, enquanto a Palestina foi abandonada, isolada, murada, golpeada e limpa etnicamente durante mais de 78 anos, sem despertar uma verdadeira indignação por sua parte?


A dignidade da comunidade internacional exige que respalde o Estado sul-africano por ter recordado os princípios intangíveis de jus cogens (norma imperativa) e que se oponha aos ataques e ameaças dos quais esse país é objeto, em particular de parte da administração estadunidense.


Como respondem ao fato de que não foram respeitadas, e muito menos implementadas, as medidas provisionais da Corte Internacional de Justiça?


Em nome da universalidade, em nome do ser humano, estão dispostos a permitir ainda mais fome, mais destruição massiva, mais deslocamentos de população?


Enquanto membros da comunidade internacional, vocês não estão em posição de evitar que as relações de poder político prevaleçam sobre as normas de jus cogens do direito internacional e do direito internacional humanitário, estabelecidos para regular o uso da força e proteger as populações civis?


Nós, os povos das nações, exigimos que vocês, os Estados, como membros da comunidade internacional que representam os Povos das Nações, trabalhem urgentemente para estabelecer garantias que evitem a desestruturação do direito internacional, ou inclusive o desgarro das relações de poder, para que as relações sociais internacionais e as relações internacionais não estejam determinadas pelo papel dominante dos Estados Unidos, cujo giro para a extrema-direita é hoje o principal perigo que paira sob o planeta.


Sejam humanos, se ainda puderem: tem o poder de deter o genocidio e a limpeza étnica do povo palestino!


O futuro do nosso mundo depende do futuro da Palestina!