TERREMOTO POLITICO NA FRANÇA

por Chantal Liégeois

Imagem: Reprodução Brasil de Fato

 

Nesta quarta-feira (04/12), a França viveu  mais um capítulo de turbulência política, com a queda do primeiro-ministro Michel Barnier e seu governo,  após apenas três meses de mandato, fato inédito na França desde 1962. Os dois blocos de oposição na Assembleia Nacional, a Nova Frente Popular (NFP, esquerda) e o Reunião Nacional (RN, extrema direita) adotaram (por 331 votos a favor, com maioria fixada em 288) a moção de censura do NFP  contra o governo de Michel Barnier.

 

Na segunda-feira, (02/12), Michel Barnier, na ausência de uma maioria clara na Assembleia Nacional, recorreu  ao artigo 49.3 da Constituição, para aprovar sem debate  seu projeto de lei de financiamento da Seguridade Social. Mas ele foi censurado pelos dois blocos mais importantes do Parlamento.

 

Refletindo o intenso debate na Assambleia francesa na noite de 04/12 (transmitido ao vivo pela RFI) e alguns discursos relevantes,  Boris Vallau, do partido Socialista, integrante da Novo Frente Popular,  dirigindo-se ao primeiro ministro, afirmou: (...) o senhor anunciou estabelecer um novo método, uma nova cultura, uma cultura de compromisso (...) em nenhum momento o senhor entrou em diálogo com a esquerda e os ecologistas”. “Essa moção de censura é, antes de tudo, o seu fracasso, o fracasso do método Barnier”. ‘Tornou-se mais conveniente para você conversar com a extrema direita do que com a esquerda’, lamentou. 

 

A presidenta dos deputados da França Insubmissa (LFI), Mathilde Panot reagiu:  “Finalmente, o governo Barnier caiu, assim como o seu violento orçamento (...) agora cabe a Emmanuel Macron partir. (O mandato de Macron vai até 2027). E Olivier Faure (primeiro Secretário do PS) no sua conta Twitter, "Quero que Emmanuel Macron finalmente ouça o povo francês, que colocou a esquerda na liderança nas eleições legislativas, mas sem maioria absoluta. Devemos respeitar essa escolha e aceitar um primeiro-ministro de esquerda que esteja aberto a compromissos."

 

Por sua vez, Marine Le Pen (RN), no noticiário das 20h no TF1 declarou “Achei fácil e honroso defender os franceses, inclusive ao custo de ser forçada a somar meus votos à França Insubmissa". Para ela, a situação atual é da responsabilidade de Emmanuel Macron. Ela garantiu que “deixará o futuro primeiro-ministro   trabalhar (...) para co-construir um orçamento aceitável para todos ”.

 

Os impactos na Europa 

Esses conflitos internos na França impactam a UE como um todo. Desde a reunificação da Alemanha em 1990, França e Alemanha são vistas como o "motor" da União Europeia (UE).  A Alemanha também passa por uma crise política interna após o colapso de sua coalizão governamental e com eleições antecipadas previstas para fevereiro de 2025. Com a França e a Alemanha em crise e líderes autoritários  de extrema direita surgindo na Hungria, Eslováquia, Romênia e Paises Baixos, a União Europeia está enfraquecida na geopolítica global.

 

Juntando-se à crise política, vem a crise econômica. França é a segunda maior economia da zona do euro, e seu déficit orçamentário está muito além do limite permitido pela União Europeia. A dívida pública também é alarmante. Isso pode ter impacto tanto no custo de vida da classe trabalhadora francesa quanto, a longo prazo,  no euro moeda comum da UE.  A Alemanha, maior economia da UE, também enfrenta problemas. Sua robusta indústria de exportação foi enfraquecida a ponto de arrastar países da Europa Central e Oriental, tradicionalmente sua base produtiva, para um cenário econômico de queda.

 

Um impacto da crise política francesa está relacionado também ao poderio militar da União Europeia. A França é a única potência militar de grande porte da Europa continental, além do Reino Unido. O apoio incondicional da UE à Ucrânia frente a Rússia pode complicar-se após a posse do próximo presidente dos EUA, Donald Trump, que anunciou sua insatisfação com os insuficientes gastos europeus de defesa  e quer reduzir a ajuda militar a Kiev com argumento do déficit comercial dos EUA.

 

As perspectivas 

Com a queda de Barnier, caiu sua proposta de Lei de Finanças. O governo demissionário continuará administrando os “assuntos correntes”  e, antes de 19 de dezembro, poderia apresentar um projeto de lei especial para prorrogar o orçamento atual, com a cobrança de impostos atuais, para não paralisar totalmente o país. O presidente Emmanuel Macron terá que nomear um novo primeiro-ministro. O governo que sucederá o de Michel Barnier proporá um novo projeto de lei de finanças, que será debatido e adotado em 70 dias.

 

Sob a lei francesa, novas eleições parlamentares só podem ser realizadas daqui a um ano. No entanto, o Parlamento continuará dividido entre três blocos políticos rivais, capazes de paralisar reformas urgentes e o orçamento, o que significa que a crise francesa está longe de se resolver. A instabilidade vai continuar. 

 

Fontes: